Vênus Contra-Ataca (Caiê)
(Este texto foi escrito na semana anterior ao referendo e protesta contra a campanha que estava a ser feita pela Igreja Católica. Não é mais actual. O aborto segue rigorosamente proibido no país, salvo nos casos de risco, aos quais o Estado confere exceções.)
OS GENEROSOS AVISOS DA SANTA MADRE
Sou contra proselitismos. Sou contra marketing disfarçado. Detesto que me inculquem coisas, sejam essas coisas ideias, conselhos (oh, as generosas pessoas que dão conselhos de graça!...), a margarina ou o detergente em promoção do hiper, a roupinha da moda ou qualquer política de opressão. Deixem-me pensar e agir por mim. Obrigada pela mãozinha, mas já sei que vem aí um braço agarrado.
Há semanas (repito, semanas!) que venho recebendo no correio uns papelinhos que me avisam - e este é o termo certo! - para votar "não" a 11 de Fevereiro, na questão da despenalização da IVG.
Apelam ao catolicismo (sabem lá se sou católica ou não...), ao desrespeito que é terem marcado o referendo para o dia de Nossa Senhora de Lourdes (sempre muito comemorado em Portugal, como sabemos; quem não vai em peregrinação daqui até Lourdes, França, ponha a mão no ar... bem me parecia!), aos 90 anos da aparição da Virgem que é a nossa mãe celestial e chora verdadeiramente por estes abortos que estas senhoras vão todas fazer quando as famílias fizerem este atentado brutal e cobarde contra os inocentes, relembram que a Virgem disse que "em Portugal conservar-se-á sempre o Dogma da Fé" (lá que os outros países e outras fés caiam no Inferno não interessa aos santos... Portugal católico, sublinho católico porque há outras realidades dentro de Portugal que são esquecidas, está a salvo e sob a protecção da Virgem, enquanto não abortar indefesos!).
Este papel avisa-me que, para não decepcionar a minha "Mãe do Céu", devo também comprar um terçozinho, o Terço da Vida, para rezar ao menos uma vez antes do referendo e participar na grande súplica nacional a Nssa. Sra. de Fátima (de repente, já não é a de Lourdes, dando-se aqui uma elegante metamorfose para o produto nacional).
Muito me surpreendia se não se fizessem uns dinheiritos à custa disto... Realmente, a compra do Terçozinho da Vida vem a calhar. E, ainda, o livrinho ilustrado "O Rosário da Vida", tudo para que não mais se ouçam os gemidos dos inocentes por nascer e não mais corram as lágrimas da Virgem.
Claro que todos temos direito à nossa opinião. Martelá-la na cabeça dos outros é que já me parece absolutamente desnecessário. Ameaçá-los com o fogo eterno, dizendo-lhes que serão excomungados se votarem "sim", é abusar do poder eclesiástico e aproveitar-se do medo de alguns. Já nem falo da restrição de liberdade que tudo isto é.
Quanto à venda final, expressa no papelinho, não é de espantar... A partir do momento em que as Igrejas mais bonitas deste mundo passaram a vender postaizinhos, cruzes e imagens dentro do próprio local de culto, incomodando a genuína fé de quem reza com a seringada de turistas a tilintar o dinheiro, passámos a um curioso espectáculo: nenhum(a) catequista pode explicar, hoje em dia, a uma criança o episódio de expulsão dos vendilhões do Templo por Jesus Cristo, já que a Igreja Católica chamou para dentro de portas os vendilhões e abençoou-os.
Os papelinhos que me metem no Correio têm, em mim, o efeito contrário. Se eu já era pelo "sim", por todas as razões e mais alguma, hoje sou-o ainda mais.
OS GENEROSOS AVISOS DA SANTA MADRE
Sou contra proselitismos. Sou contra marketing disfarçado. Detesto que me inculquem coisas, sejam essas coisas ideias, conselhos (oh, as generosas pessoas que dão conselhos de graça!...), a margarina ou o detergente em promoção do hiper, a roupinha da moda ou qualquer política de opressão. Deixem-me pensar e agir por mim. Obrigada pela mãozinha, mas já sei que vem aí um braço agarrado.
Há semanas (repito, semanas!) que venho recebendo no correio uns papelinhos que me avisam - e este é o termo certo! - para votar "não" a 11 de Fevereiro, na questão da despenalização da IVG.
Apelam ao catolicismo (sabem lá se sou católica ou não...), ao desrespeito que é terem marcado o referendo para o dia de Nossa Senhora de Lourdes (sempre muito comemorado em Portugal, como sabemos; quem não vai em peregrinação daqui até Lourdes, França, ponha a mão no ar... bem me parecia!), aos 90 anos da aparição da Virgem que é a nossa mãe celestial e chora verdadeiramente por estes abortos que estas senhoras vão todas fazer quando as famílias fizerem este atentado brutal e cobarde contra os inocentes, relembram que a Virgem disse que "em Portugal conservar-se-á sempre o Dogma da Fé" (lá que os outros países e outras fés caiam no Inferno não interessa aos santos... Portugal católico, sublinho católico porque há outras realidades dentro de Portugal que são esquecidas, está a salvo e sob a protecção da Virgem, enquanto não abortar indefesos!).
Este papel avisa-me que, para não decepcionar a minha "Mãe do Céu", devo também comprar um terçozinho, o Terço da Vida, para rezar ao menos uma vez antes do referendo e participar na grande súplica nacional a Nssa. Sra. de Fátima (de repente, já não é a de Lourdes, dando-se aqui uma elegante metamorfose para o produto nacional).
Muito me surpreendia se não se fizessem uns dinheiritos à custa disto... Realmente, a compra do Terçozinho da Vida vem a calhar. E, ainda, o livrinho ilustrado "O Rosário da Vida", tudo para que não mais se ouçam os gemidos dos inocentes por nascer e não mais corram as lágrimas da Virgem.
Claro que todos temos direito à nossa opinião. Martelá-la na cabeça dos outros é que já me parece absolutamente desnecessário. Ameaçá-los com o fogo eterno, dizendo-lhes que serão excomungados se votarem "sim", é abusar do poder eclesiástico e aproveitar-se do medo de alguns. Já nem falo da restrição de liberdade que tudo isto é.
Quanto à venda final, expressa no papelinho, não é de espantar... A partir do momento em que as Igrejas mais bonitas deste mundo passaram a vender postaizinhos, cruzes e imagens dentro do próprio local de culto, incomodando a genuína fé de quem reza com a seringada de turistas a tilintar o dinheiro, passámos a um curioso espectáculo: nenhum(a) catequista pode explicar, hoje em dia, a uma criança o episódio de expulsão dos vendilhões do Templo por Jesus Cristo, já que a Igreja Católica chamou para dentro de portas os vendilhões e abençoou-os.
Os papelinhos que me metem no Correio têm, em mim, o efeito contrário. Se eu já era pelo "sim", por todas as razões e mais alguma, hoje sou-o ainda mais.
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