Sunday, November 26, 2006

Index Sexta Quinzena

1 – O Reação em expansão? Ah, não, essa eu quero ver! Você também? Me leiam clicando aqui, no Editorial ;-)

2 – Nova coluna destacando Comentários das quinzenas passadas. Vejam o que nossos leitores tiveram a dizer nas seletas colunas, clicando aqui

3 – Professor Toni comenta a diversidade e a tolerância raciais. Saiba mais, clicando aqui

4 – Halem de Souza comenta a Cultura e o Folclore em sua crítica literária, na coluna O Povo e o Livro. Clique aqui para saber o que ele diz

5 – Vinícius volta, se recria e se adapta, falando do segundo termo do presidente brasileiro. Concorde ou discorde, mas leia, clicando aqui

6 – Cristina Bondezan comenta a poluição visual das grandes cidades. Vale a pena conferir sua posição, clicando aqui

7 – Nana, em seu canto, também comenta a cultura e o folclore em sua linha especial, que você pode ler, clicando aqui

8 – Roberto de Queiróz pergunta: Onde foram parar as verdadeiras musas do cinema? Surpreenda-se com sua excelente coluna CLAQUE-TE, clicando aqui

9 – Rodrigo Gerdulli entrevista os Beselhos! Saiba quem são, porque logo, logo, você pode ser o único a não saber. Aproveite a oportunidade e clique aqui!

10 – Mais um pedido de romance, no Correio Sentimental. Veja se atende ao perfil, clicando aqui

11 – Deco Toledo inicía sua coluna reflexiva. Reflita com ele, clicando aqui

12 – Geraldino introduz sua história marrenta. Comece a acompanhar, clicando aqui

13 – Jens nos conta um causo de arrepiar! Saiba mais, clicando aqui

14 – Algumas músicas são intraduzíveis, mas continuo tentando. Vejam se me dou bem, clicando aqui (PS: Textos nesse estilo serão sempre aceitos ao Reação!)

Editorial Sexta Quinzena

Caros leitores e leitoras reacionárias, aqui estamos com mais uma quinzena do Reação em módulo de expansão. Algumas coisas caminham mais rápido, outras mais devagar, mas todas caminham, e isso é o que mais nos importa. O número de visitas se estabilizou, e com um contador global (experimental, ele muda, porque nós também mudaremos o sítio do Blogspot logo, logo) podemos reparar que a maioria das visitas vem do Brasil, mas muitas vêm de Portugal e algumas dos Estados Unidos. Os demais países podem aparecer como engano, mas os que demonstram número crescente de visitantes, nos doam visitantes fixos, que vêm uma vez e voltam a re-ler o que o Reação traz de melhor.

Nessa quinzena, temos mais cultura e folclore e menos política, apesar de não podermos dispensá-la por óbvios motivos. Dei aos colaboradores um tema muito vago, e talvez esperasse que usassem o tema como bem entendessem, mas prometo ser menos vago das próximas vezes, ou melhor, me comprometo. Há uma frase de meu tio, querido mestre, médico psiquiatra, que sempre ilustrou melhor para mim o que significa a cultura no Brasil, assim compreendendo seu significado melhor, de modo geral. Dizia: ‘O Brasil não tem cultura, tem folclore.’

Claro que discordo, mas não do contexto em que a frase foi usada. A cultura existe no modo pacífico do brasileiro pensar, existe em sua música, em sua literatura e em seu cinema, existe em seus movimentos populares e em sua história. No entanto, por demérito de uma educação que ainda deixa muito a desejar, talvez o que meu tio quisesse dizer seja justamente na linha da cegueira causada pela falta de informação. No Brasil, uma massa cada vez maior se esquece da cultura, da história, das raízes e dos pensamentos, e se volta ao módulo básico de sobrevivência. As crendices então tomam o espaço das possibilidades escassas, e surgem os mitos, os folclores, as lendas contadas de geração em geração e repetidas como fossem reais, como tivessem acontecido com um amigo do amigo, com a vizinha da prima da tia do Mau-Mau, aquele ex-colega de trabalho do ex-colega de escola do primo de terceiro grau do papai.

Quando ouvi da campanha do Saci, quando em tempos de Halloween os brasileiros começam a celebrar o Dia das Bruxas, não sabia se ria ou se chorava. Já ouvi de uma campanha que mudasse as expressões ‘tetra’ ou ‘penta’ campeonatos quando o time não os venceu consecutivamente, logo, nada mais me assusta por inútil. No entanto, será que a campanha faz algum sentido? Pensando cá com meus botões, imagino que o Dia das Bruxas nada tenha a ver com a cultura brasileira, nem seu folclore. Mas, em algum ponto do planeta, em terras irlandesas, escocesas, francesas e inglesas, o Dia das Bruxas tem uma conotação bastante cultural, baseada em crenças religiosas pagãs, passando por ritos e acontecimentos históricos que moldaram aquelas populações. Já o Saci Pererê não passa de uma lenda, um mito, que faz parte de nossa cultura, mas não pode representá-la só. Não acredito que haja alguma utilidade em desvincular a população da adoção cultural sem sentido de outras nações, fazendo com que se apeguem a folclores e mitos. Talvez fosse mais certo re-apresentar a esse povo nossa cultura, em todos seus aspectos, e acostumar a população a rebuscar em sua riqueza, seus novos ritos, mitos folclóricos e comemorações especiais.

Assim, nossos escritores abordaram o tema cada qual de seu modo especial, e quem não o abordou, contribui diretamente à expansão pensamental de nossa cultura em estilo próprio. Professor Toni começa falando sobre a consciência das diversidades raciais no Brasil, baseando-se em uma reportagem da revista esquerdista Caros Amigos. Halem de Souza, nosso crítico literário, está de volta com sua coluna, e trata justamente do uso nacionalista dos termos ‘cultura popular’ e ‘folclore’, e como se expressam em nossa literatura. Depois, filósofo Vinícius continua analisando o governo Lula em seu segundo mandato, e ninguém poderá detê-lo! Cristina Bondezan comenta a poluição visual e como esta nos impede uma melhor qualidade de vida urbana em sua coluna de Arquitetura Social. Nana de Freitas sobe as cortinas, abre sua boca e fala sobre nossa cultura folclórica... Ou seria nosso folclore cultural? Roberto de Queiróz explora a cultura popular como crítico cinematográfico, e impõe respeito dizendo: CLAQUE-TE! O que diabos aconteceu com as musas do cinema? Uma entrevista para lá de especial com uma banda que ainda pode – e muito! – dar o que falar. Os Beselhos, em entrevista interessantíssima de Rodrigo Gerdulli, no Toque do Toque, Gerdulli e a Musa Musical. Mais uma carta selecionada ao Correio Sentimental, vocês mulheres, leiam e vejam se se adequam ao perfil! André Toledo estréia sua coluna reflexiva no Reação. Geraldino Marrento, depois de muita encheção de saco, me convenceu a publicar sua saga. O faço, porque meu ouvido não é penico, e o Geraldino até que manda muito bem. Direto de sua trincheira, Jens volta a escrever para o Reação, e dessa vez explora um causo bizarro, ocorrido em suas terras, que alguém amigo de muitos alguéns lhe contou. E um pouco do meu gosto musical, explorando Minha Música, Música Minha, a compensar a ausência espantosa do Canto dos Versos.

Uma nova coluna destaca seletos COMENTÁRIOS da quinzena passada. Confira, comente e participe! Tentei e tentei, mas não foi dessa vez que o cartunista se reúne ao Reação. Só tenho a dizer que será, e que há gente bacana e interessada, disposta a dedicar seu tempo para enviar trabalhos personalizados, driblando a correria do dia a dia. Eu sei que vale esperar, e sou muito grato pela atenção e carinho dos manifestados. A coluna indígena também volta em breve!

Ademario, da terceira quinzena, está montando uma peça teatral, e recomendo que escrevam para entrar em sua lista de contatos à publicidade de suas peças e acontecimentos culturais. Um colunista sobre esporte e saúde também deve eventualmente se juntar a nós...

Mas, a promessa para as próximas quinzenas é ampliar meu público local em Miami, apresentando bandas de brasileiros imigrantes de um modo único, falando sobre suas vidas, suas lutas, sua música e seus planos ao futuro. Para quem conhece, são celebridades, mas para quem não conhece, ensinam a sobrevivência internacional da arte brasileira, e de sua força na sobrevivência do indivíduo imigrante.

PARTICIPEM, pessoal. Quanto mais sugestões, mais crescimento. Se me enviarem textos, poemas, quadrinhos, entrevistas, biografias... Tudo será aceito com gosto. Precisamos reagir individualmente por nossos grupos. O Reação para isso está. Obrigado a quem nele acredita, e pau na máquina!

Abrax a todos,
Roy Frenkiel
O Editor que não edita

Comentários da Quinzena Passada

Lady Marmelade (No Editorial)

Nós, do Blog Lady Marmelade, concordamos plenamente com suas idéias.Devemos parar de olhar para o nosso próprio umbigo, tomar coragem e, quem sabe um dia, sair novamente às ruas para exigir mudanças nesse país de desesperado.Só que desta vez sem a influência de uma rede de TV...Passe em nosso Blog se puder e confira nossas idéias http://www.ladymarmelade.blig.com.br/

Santa (Na coluna de Silvio Vasconcelos)

Assistir pela TV, cenas deprimentes como as de hoje na inauguração da ponte sobre o rio Orinoco (Venezuela) onde o Brasil investiu 600 milhões. Lula no discurso referiu-se aos "homens e mulheres da Bolívia" a encantar incautos venezuelanos. Lula, o cabo eleitoral do chavismo, com todas as despesas bancadas pelo dinheiro brasileiro. Dois loucos, alucinados pelo poder, enquanto homens de bem, estão assim, trancafiados, pelo medo.

Luciana Avelino (No Canto de Nana)

Ei Lili, tô aqui no fechamento da revista e decidi dar uma conferida pra refrescar a cuca... Adorei, mesmo sem ter tido happy end. Beijos e bom fim de semana!


Luciano Piccazio (Arte Free - Na coluna Venus Contra-Ataca)

...e o mais engraçado é pensar que os novos medos das novas gerações sao os novos medos de todas as gerações... a história é cíclica

Silvio Vasconcelos (Na coluna de Arquitetura Social)

Infelizmente no Brasil, políticos trabalham apenas para manter-se no poder e beneficiar seus financiadores. Não há políticas de médio e longo prazo capazes de devolver à Natureza essa áreas e promover inclusão social de forma fraterna e humana às pessoas que lá vivem. O modelo de favelas cariocas, oriundo da escravatura e das benesses pós Antônio conselheiro e o rearranjo urbano do Rio do início do século, acabou por transplatar-se para outras regiões. Porto Alegre abriga suas favelas ao seu redor e nas regiões que hoje se reconhecem como quilombolas. Não será diferente do que se vê em outras capitais.

Camila Canali Doval (Na coluna de Luciano Piccazio)

Concordo atentamente. Mas pergunto:E Los Hermanos? Tão bons, tão exatos, tão sinceros...Não farei de Camelo um Chico, mas o rapaz é bom, sim.Um abraço, colega de Reação!!!

Resposta:

“Oi Camila!Los Hermanos, assim como Teatro Mágico e Ludov, é uma das boas surpresas da nossa geração. uma banda de Rock de ótima qualidade, que faz músicas de MPB melhores do que essa galera que está aí hoje.”

Professor Toni



Diversidade e Tolerancia Raciais
Por Prof Toni


A revista Caros Amigos deste mês entrevista a ministra da Promoção de Políticas da Igualdade Racial, Matilde Ribeiro. Brilhante!
Entrevista densa, temas tratados com profundidade, uma verdadeira aula sobre a questão racial no Brasil.
Ela relata avanços e percalços neste primeiro mandato do presidente Lula, abordando de forma clara as ações afirmativas, dentre elas a questão das cotas nas universidades.
Clicando aqui você tem uma amostra da entrevista que está na edição impressa.
No portal Terra, temos uma notícia interessante, que socorre parte das intervenções da ministra: Comissão condena Brasil por caso de racismo (clique no título para ler a notícia).
Deprimente!
A condenação da OEA é inédita, também a desfaçatez da justiça paulista o é.
Uma senhora – que tem a sua identidade preservada – colocou um anúncio pedindo uma empregada doméstica “preferencialmente branca”.
A negra Simone André Diniz ligou para o telefone que constava no anúncio e após revelar a sua cor foi preterida.
Imediatamente entrou em contato com a OAB e houve uma grande campanha, envolvendo mais de 100 entidades, para que os seus direitos fossem respeitados e a “anônima” anunciante punida. Isso em 1997!
Para a surpresa de todos, o inquérito policial – concluído em 14 dias – não responsabilizou ninguém pelo fato.
O Ministério Público então pediu o arquivamento do caso, argumentado que não havia "qualquer ato de racismo" ou "base para oferecimento de denúncia" (segundo matéria da Folha de S.Paulo, de 18/11/06, só para assinantes).
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA (Organização dos Estados Americanos) foi acionada e condenou o Brasil a reabrir o caso, indenizar Simone, reconhecer publicamente a violação de seus direitos e patrocinar um curso universitário para ela.
Essa é a justiça do nosso país.
Uma criminosa, aliás, que pratica e faz prova contra si (o anúncio) de crime inafiançável é protegida pela Lei e pela grande imprensa, pois teve seu nome preservado, e poucas foram as notícias, com as raras exceções de sempre, sobre o evento.
O inquérito policial corre com uma celeridade anormal, para nada concluir, embora lá estivesse o anúncio com telefone e tudo mais que fosse necessário para colocar a fulana atrás das grades.
Enquanto isso a poderosa Rede Globo comemora seu sucesso de audiência numa novela do horário intermediário e, canta aos quatro cantos, chama a atenção para o sucesso do primeiro casal de negros a protagonizar uma novela. Não sou especialista no assunto, mas gostaria de ouvir a opinião da galera, principalmente das pessoas do Movimento Negro sobre a eficácia desse “sucesso” e o perfil dos personagens interpretados pelos dois excelentes atores, Lázaro Ramos e Taís Araújo.


Licenciado em Geografia pela Universidade de São Paulo. Docente desde 1993, é professor do CPV Vestibulares desde 2004. É autor do Material Didático de Atualidades para as turmas de Pré-Vestibular do CPV. Foi consultor do Portal Klickeducação.Atuou junto ao Núcleo de Educação de Adultos da Faculdade de Educação da USP, elaborando material didático para os professores, lecionando para o Grupo de Alfabetização Solidária e prestando assessoria para Prefeituras e ONGs.

O Povo e o Livro

Casamento difícil: “Sá” Literatura e “Seu” Folclore
Por Halem de Souza

É freqüente o uso da cultura popular e do folclore, com propósitos nacionalistas e em diversas partes do mundo, para afirmar a identidade de um povo, buscando as bases fundadoras das várias sociedades nessas duas modalidades da cultura ou apenas reforçando as diferenças, hierarquizando, estabelecendo o que é “inferior” e o que é “superior”. A Literatura não escapou desse uso. E no caso brasileiro, o período especialmente marcado por esse intento ocorreu na primeira metade do século XX.

Em três obras distintas – O triste fim de Policarpo Quaresma, de Lima Barreto (1915); Macunaíma, de Mário de Andrade (1928); e Histórias da Tia Nastácia , de Monteiro Lobato (1946, provavelmente) – podemos ver as tentativas, de alguns literatos de peso, para promover o casamento (difícil) da Literatura com o Folclore, tentativas essas nem sempre bem sucedidas.
O triste fim de Policarpo Quaresma, todos sabemos, narra as desventuras do major tentando realizar três sonhos patrióticos de elevação do Brasil: através da cultura, através da agricultura/trabalho e, por fim, através da política.

Sabemos também que foram baldados todos os seus esforços. Mas é no primeiro sonho do major Quaresma que nos deteremos. Logo no início do romance, temos a informação de que Policarpo tomava aulas de violão e queria aprender a tocar “modinhas” por entender ser o instrumento e o tipo de composição mais adequados à cultura brasileira. Mais do que isso, resolveu conhecer os costumes populares, as tradições folclóricas, pela sua “significação altamente patriótica”. Em companhia do general Albernaz vai visitar uma certa Tia Maria Rita, “uma preta velha(...)antiga lavadeira da família Albernaz”. Lá chegando, decepcionam-se: a velha, já um pouco caduca, não se lembra de quase nenhum folguedo, brincadeira ou canção antiga. Vemos, de forma velada, a denúncia de Lima Barreto, mostrando como um ex-escrava, sempre explorada, ainda por cims só tem serventia para a sociedade pós-escravocrata enquanto repositório de itens de entretenimento para seus antigos senhores. A cultura popular e o folclore são vistos pelo seu valor de uso.

Macunaíma, mais do que um dos livros fundamentais da cultura brasileira, é o resultado de um vigoroso esforço intelectual de seu autor. Mário de Andrade empreendeu uma significativa pesquisa das tradições brasileiras, como grande folclorista que foi, e deu a elas feição literária, construindo, para além de sua importância cultural, um livro divertidíssimo de se ler. O pesquisador, nesse caso, não suplantou o artista. Aqui, folclore e cultura popular caminham lado a lado com a Literatura, e esta não se encontra em posição superior aos dois primeiros.

Histórias da Tia Nastácia corresponde a um dos (pouquíssimos) senões da extraordinária obra infanto-juvenil de Monteiro Lobato. Por sugestão de Pedrinho, Tia Nastácia vai narrando diversas histórias folclóricas, de origem africana, européia e indígena. Ao final de cada uma, os outros personagens do Sítio comentam a narrativa que acabou de ser feita. São nesses comentários que estão os equívocos desse livro. Lobato, como muitos outros escritores, foi influenciado pelas “contadoras de histórias”, em sua maioria mulheres negras que, de forma itinerante, visitavam fazendas e casas. Ele reconhece o valor dessas mulheres e dessas narrativas, mas procura julgá-las (e é um julgamento o que se faz nos comentários) por critérios adequados apenas à Literatura. Munido de conhecimentos antropológicos e etnográficos bastante limitados, Lobato se esqueceu de que era “apenas” um genial escritor. Nesse caso, a cultura popular e o folclore são colocados de forma inferiorizada diante da Literatura.

Filosofando com Vinicius

Um aspecto da organização popular e o segundo mandato

Filósofo Vinícius


Re-analisando a proposta do amigo Roy, procurei, nesta edição, um estilo mais solto (e menos acadêmico), fazendo lembrar o bom e velho Pasquim. Se não consegui, deve ser porque sou tão engraçado quanto um monge tibetano (e se essa piadinha cretina não teve graça, estou mesmo certo quanto a minha fracassada aptidão humorística). E mais: o Roy é inocente no meu eventual insucesso. O que há de bom no Reação Cultural é que posso lavar a alma.

Lá vamos! (Ou, lavamos!)

À margem dos despeitados conservadores que tanto odeiam um governo candidamente popular, cá estamos com mais um mandato. Apesar das críticas severas que oferecemos ao governo Lula, mil vezes um “sindicalista nascido de mãe analfabeta” do que um legítimo representante da canalhice reacionária burguesa. Ainda mais se a mesma é representada por um candidato insosso e com cara de pastel frio e sem sal (pois picolé de chuchu é moda do verão passado).

Mas já passamos por esse blábláblá nas outras edições. Vamos a algo novo. Triste país onde o candidato popular precisa ser pressionado pelos movimentos sociais para ver se desempaca. Mas o povo crítico e consciente é assim mesmo: acostumado a brigar feio todos os dias, apanha, apanha e apanha!, mas está sempre de pé. E podem maldizer o quanto quiserem do vírus foice-martelo: Comunista é bicho imortal. Enquanto houver miséria, haverá rebelião.

Assim, nosso governinho cor de rosa precisa de umas trombadas para acordar: há uma imperativa necessidade de grandes mobilizações. Mas se mobilizar para o quê? Num primeiro momento, para revisão do atual modelo econômico conservador no qual ainda se privilegia o capital financeiro internacional. Quando definitivamente o capital mais precioso for o ser humano, talvez tenhamos tempo para firulas.

No entanto, combater o capitalismo é vasto demais. Pontualmente, precisamos (descrevemos tudo numa grande porrada): anular o leilão da Companhia Vale do Rio Doce (tsc! tsc! tsc!); criar uma reforma política democrática, com respeito á pluralidade democrática e mandando às cucuias a famigerada cláusula de barreira (e que venha a fidelidade partidária); incrementação dos modos de participação popular (ainda que seja uma participação indireta, temos referendos, plebiscitos... numa melhor perspectiva, temos orçamento participativo e conselhos populares); por fim, mas sem esgotar o tema (só para dar uma folguinha) a democratização da mídia (e este site do Roy é um exemplo... Mas o ideal é que houvesse financiamento público para outras iniciativas).

Prezados leitores, vamos ficando por aqui. Noutras edições, se nos for permitido, haveremos de tratar com mais profundidade as questões tratadas. Até lá.

Vinícius, o cavaleiro da triste figura

Arquitetura Social


Poluição Visual nas Cidades

Por Cristina Bondezan

Em várias cidades brasileiras, principalmente São Paulo, percebemos que a qualidade de vida perdeu a guerra para a poluição visual. Há propagandas espalhadas em toda parte – outdoors, back ligths, front ligths, totens imensos, propagandas junto às placas denominativas das vias, elementos infláveis nos imóveis, dispositivos metálicos nas esquinas que fingem “proteção” aos pedestres, enfim, toda sorte de bloqueios `a visibilidade e ao livre caminhar.

Esses elementos são colocados em logradouros públicos ou privados, mediante sistemático apelo financeiro para a competente autorização do poder público o qual, geralmente sem uma lei que regulamente a colocação desses equipamentos, vai autorizando, permitindo, fechando os olhos já pouco abertos, feito uma biruta em dia de tempestade, em total prejuízo da população, principalmente daquela que vive na cidade, que trabalha, que anda, que passeia com suas crianças, que utiliza o transporte de massas ou veículos. Se falarmos na parte ilegal, então, os dados são alarmantes:

Só na cidade de São Paulo existem cerca de 15 mil outdoors clandestinos, ou seja, sem recolhimento de taxas, sem autorização, sem análise técnica de adequação ou não para aquele local – marca sem precedentes – assim como a omissão e a falta de fiscalização .

Reverter esse quadro crônico e devolver cidades limpas e mais seguras aos cidadãos é mais um trabalho de gigante para as prefeituras que necessitam, prioritariamente, de gestores com a famosa e desacreditada “vontade política” para cuidarem das cidades com respeito, interesse , zelo - e por que não amor ? - impondo-lhes regras e oferecendo segurança e bem- estar aos seus habitantes e não deixá-los à mercê de uma realidade estética visual no mínimo suspeita , comparada a um quarto de adolescente mal orientado. É possível legislar seriamente visando o interesse público – basta querer.

Todo cidadão tem o direito a uma cidade limpa, bonita, organizada, com uma paisagem decente e não invadida por espécies de predadores, que de tão livres passam-nos a sensação que o lugar urbano é propriedade exclusivamente deles, são movidos pelo lucro ansioso e imediatista, pressionam a população com estímulos meramente de consumo, dos quais ela não consegue fugir ... Não dá para desligar ou mudar de canal.

As referências visuais das cidades, a arquitetura, os marcos históricos importantes, a natureza, ficam escondidos sob as propagandas, transformam-se em suportes para elas e o pior: Não agregam informações para o cidadão comum. É um mundo agressivamente ilusório, sobretudo para os menos favorecidos. É preciso reforçar o potencial e a identidade das cidades, o sentido de lugar, de espaço pertencente a toda uma comunidade - essenciais à integridade psíquica do habitante.

Cristina Bondezan é arquiteta e urbanista. Nasceu e cresceu em São Paulo entre os italianos dos bairros do Cambucí e da Mooca. Exerceu cargos públicos na área de Planejamento Urbano, é docente do curso de "Design de Interiores "nas disciplinas : Projetos, Revestimentos , Gestão e Empreendedorismo. Seu escritório profissional situa-se na cidade de Marília, interior de SP . Um sonho : Ver o Brasil livre do parasitismo político . Um prazer : viver em amplitude e com olhos atentos...

Canto de Nana




PAU QUE NASCE TORTO...
Por Nana de Freitas

Boca do Povo, de www.mariacartolina.com

Na porta da casa simples, na periferia de Nossa Senhora dos Ventos Curvos, a chegada da manhã revelava a fila que se formara há 78 dias. Antes disso, a linha de espera se recriava toda madrugada, a partir das horas em torno das quatro, mas dissipava-se ao cair da noite. Há mais de dois meses, no entanto, a fila era uma só. O atendimento parava, a fila continuava ali, crescendo em silêncio, como massa de pão, à espera de um novo raiar de sol.

Antônio Baltazar Barbosa do Prado tinha virado notícia no jornal da capital, em edição publicada 79 antes desta alvorada, em reportagem das grandes que até o padre de Ventos Curvos já chamava de “estopim da peregrinação”. Aos 91 anos, com experiência que somava dois casamentos, 14 ocorrências públicas de infidelidade, mais um caso de 20 anos com a viúva do padeiro – 16 filhos, 37 netos e sete bisnetos vivos –, seu Baltazar virou “santo”.

Andava com dificuldade e só comia papas, pois o dente que lhe restava se fora há quatro anos, na tentação de um pé-de-moleque, em noite de São João. Pouco sobrava naquele homem que desse pistas do caixeiro-viajante que fez a vida na arte de encantar – clientes e mulheres – com as palavras.

Aos seus, dirigia apenas vocábulos estratégicos. “Fome”, “sede”, “frio” e afins. Corria à boca pequena que o silêncio do velho vinha da mágoa de saber que a neta se emprenhou de um tal boto que escorregou do Amazonas e foi dar num córrego que banhava a cidade. Baltazar, no entanto, evitava colóquios por motivo menor. Sem quê nem para quê, simplesmente não conseguia se lembrar de um nome que fosse vivo na casa. Isso, três anos atrás. Hoje, sequer se lembrava que havia esquecido.

Acontece que, nessas coisas da vida, Seu Baltazar, que já não sabia de si quem era, trazia na ponta da língua cada ditado popular que ouvira nas andanças pelas Minas Gerais. E danava a declamá-los, um atrás do outro, a quem quer que lhe desse ouvidos e não fosse parente.

Arrumado para o banho de sol em cadeira na calçada, recebeu, numa terça-feira, o sorriso da moça triste que passava rumo ao armazém. “Água e conselho só se dá a quem pede”, disparou o velho, estancando o passo da moça. Certo da atenção que recebia, emendou: “Casamento se desmancha até na porta da igreja”. Emocionada, a jovem se encheu de ânimo e estreou um andar resoluto, enquanto ainda ouvia, ao fundo: “Marido velho e mulher nova, ou corno ou cova”.

Antes de raiar a quarta-feira, a notícia se espalhou na cidade. A filha de Maristela fugiu com Deco de Dona Júlia e deixou a ver navios o coronel Feliciano, a quem era prometida desde debutante. Antes, escreveu aos pais um bilhete. “Seu Baltazar me abriu os olhos para a vida. Folhinha e noivado só prestam por um ano”. Era o primeiro “milagre” do velho.

Daí em diante, começaram as visitas. Seu Baltazar nem mais ficava ao passeio, devido ao tumulto. Olhos fitando o nada, dava constante seqüência à fila, com o limite – controlado pelos parentes – de três provérbios de bônus e R$ 2 de ônus a quem o consultasse. Gente que entrava sorrindo saía chorando, e vice-versa. E atribuíram a Baltazar previsões dos quatro cantos do mundo. “Quem de moço não morre, de velho não escapa”, teria dito o matuto, prevendo a morte do papa. Em clara referência a Fidel, o ancião vaticinara: “Desgraça de velho é 3Q: queda, ‘qatarro’ e ‘qaganeira’”.

O título de padrinho dos gays, Baltazar ganhou em consulta de ator famoso. “Lé com lê; cré com cré”, decretou. E emendou com um recado claro à modelo estreante em novelas: “Antes a feia de barriga cheia do que a bonita que de fome grita”.

Ao presidente, atendido em esquema especial, o velho teria advertido, ameaçado e aconselhado, em três etapas sem pausa. “Cutia ficou sem rabo de tanto fazer favor. Cria um corvo, que ele te arrancará um olho. O pior cego é aquele que não quer ver.” Uma semana depois, a profecia de Seu Baltazar ganhava sentido nas bancas de jornais.

Sol a pino no céu , fila longa, a bailarina baiana causou furor na chegada. Short e top colados ao corpo, vinha junto com o namorado cantor. “Na cauda é que está o veneno”, suspirou Seu Baltazar, com ambígua lucidez. “Onde come um, comem dois”, arriscou o velho, sem obter resposta. “Santo de casa não faz milagre”, despediu-se e morreu, vislumbrando o paraíso.
Contemplando a própria morte, já um terceiro na cena, Baltazar ria de si ao lembrar o que sabia: ”Quando Deus dá a farinha, o diabo esconde o saco”.

CLAQUE-TE


O que aconteceu com as musas do cinema?
Por Roberto Queiroz

Desde que me entendo por gente o cinema foi palco de muitas musas, mulheres estonteantes, de sorrisos fáceis e gestos encantadores que alucinavam a cabeça e os pensamentos de muitos marmanjos. O tempo passou, meu siso cresceu (piadinha infame à parte!), porém o padrão de beleza imposto pela indústria cinematográfica mudou radicalmente. E pior do que isso: fez com que eu revisse o conceito “mulher sexy” no cinema de forma drástica.

Parece que foi hoje que assisti a um filme estrelado pela atriz Audrey Hepburn (não, eu não sou tão velho assim. Eu vi o filme em VHS). A película em questão era Bonequinha de Luxo, adaptação da obra-prima literária do escritor americano Truman Capote. Logo a seguir vieram My Fair Lady e Charada e eu me apaixonei por essa mulher de quadris finos e lábios angelicais. De lá para cá minha curiosidade aumentou por invadir esse universo feminino e conhecer seus mais famosos exemplares – algo que, com certeza, cineastas como Billy Wilder e Pedro Almodóvar teriam adorado. E que lista, meus nobres leitores: Marilyn Monroe, Elizabeth Taylor (quando revejo a cena da massagem em Cleópatra vou ao êxtase), Sophia Loren, Gina Lollobrigida, Lana Turner, Kim Novak, Natalie Wood (destaque para ela bronzeada em Amor, sublime Amor), Claudia Cardinale, e tantas outras divas que não poderei enumerar por falta de espaço e tempo.

No entanto, com o passar dos anos e o aumento do espaço do mercado independente no cinema mundial, a presença das mulheres na tela – se tomarmos como referência o ponto de vista estético – sofreu significativas alterações. A mulher de lábios finos, traços sutis, pernas levemente arredondadas, deu lugar a uma nova espécie de atriz. O encantamento agora é destinado às mulheres de boca grande, lábios carnudos (modelo esse que Angelina Jolie têm vendido muito bem ns últimos anos), corpos marombados (Michelle Rodriguez, Geena Davis) e pernas grossas e firmes (Demi Moore pós-casamento com Bruce Willis e Sharon Stone). E eis que surge o cerne do problema: o que aconteceu com a singeleza de Vivien Leigh em E O Vento Levou? Por que substituir o rosto sublime de Olívia de Havilland pelas excessivas plásticas de Carmem Electra? Enfim, por que essa mudança?

O pobre colunista desse humilde portal sente a carência desse tempo lúdico em que nudez não era mais do que um complemento da arte. Pensar em mulheres fazendo o que Sharon Stone fez em Instinto Selvagem ou no strip-tease de Natalie Portman em Closer: Perto Demais era quase um acinte. Porém, em tempos de terrorismo e de uma indústria que vende celebridades como quem vende roupas e calçados, essa mulher d cinema também teve de mudar. Só que essa mudança não agradou muito o colunista que vos fala.

Quem são essas musas de hoje? A queridinha dessa classe, sem sombra de dúvidas, é Scarlett Johannsen. Em pouco tempo de carreira já fez por seu futuro do qualquer atriz de sua geração: Dália Negra, O Grande Truque, Match Point – Ponto Final, Moça com Brinco de Pérola, A Ilha, entre outros. Não podemos esquecer também de Keira Knightley, musa da geração anoréxica, magra de doer, em Piratas do Caribe, Orgulho e Preconceito e Rei Arthur (esse último com direito à micro-roupas que expõem seus ossos exuberantes). Angelina Jolie, a Sra. Brad Pitt, tem a vantagem de ser filha de um ídolo da Meca cinematográfica (o hoje eterno vilão Jon Voight). E, claro, não podemos deixar de fora, Jennifer Lopez, Monica Belluci, Rachel Weisz (essas, sim, musas de fato, com M maiúsculo), a queridinha dos americanos Julia Roberts, entre tantas milhares de outras perseguidoras dos quinze minutos de fama.

Despeço-me desta edição deixando claro o meu descontentamento com esse novo modelo estético e ficando aqui registrado a minha eterna afeição por aquelas mulheres que realmente fizeram a história do cinema mundial. O que só vem provar a falta que o passado nos faz. E tenho dito, senhores leitores do Reação Cultural!
Roberto de Queiroz

Carioca, 29 anos, morador da cidade maravilhosa,amante das mais inusitadas expressões artísticas (emparticular da sétima arte), do qual me considero umconfidente mordaz.

Toque do Toque, Gerdulli e a Musa Musical






Eis que os Beselhos nos brindam com Ovreca

Rodrigo Gerdulli entrevista Beselhos

(Confiram os Beselhos no Orkut, clicando aqui, apenas para quem tem, claro)


Genuinamente gaúchos, os Beselhos acabam de lançar seu primeiro CD, Ovreca. Com bom humor e composições criativas e originais, o trio composto por Diego Grando (guitarra e voz) Daniel Rech (baixo e voz) e Diego Altieri (bateria e voz) aposta na tradição das bandas do Sul do país para ganhar, merecidamente, espaço no cenário nacional.


(FOTO DA CAPA DO CD)

Quem são os Beselhos?

Diego Grando – Difícil, né? (pensando) Tem que dizer algo além do nome?

Daniel Rech - Diego Grando Diego Altieri e Daniel Rech


Há quanto tempo a banda está na estrada?

Diego Grando – Começamos no ano 2000, quando gravamos uma fita-demo chamada ‘Turnê na Terra’. Fizemos nosso primeiro show num 1º de setembro. De lá pra cá, gravamos outras duas demos (‘Falando Sozinho’ e ‘Alguma Coisa’) e fizemos alguns shows. Não sei muito bem se isso é estar na estrada, mas... acho que responde à pergunta.

O que diabos é "Ovreca"?

Diego Grando – Acho que é um amadurecimento sem caretice. É, é isso. É a nossa medida certa entre a vontade de fazer música do jeito que quiser (misturar, copiar, inverter, subverter, mudar tudo) e de fazer música para os outros (será que isso é ser pop?). Enfim, é o que a gente sabe fazer, exatamente do jeito que a gente quer fazer.

Diego Altieri – Tudo se torna mais simples se olharmos pelo espelho...

Como foi e quanto tempo levou o processo de gravação?

Diego Grando – Bom, já tínhamos a idéia de gravar o disco há um bom tempo, talvez desde 2004. Mas, de fato, decidimos tudo isso em 2005. Fizemos alguns shows até agosto e depois paramos pra fazer uma pré-produção. O disco nasceu aí, na real: começamos a trabalhar mais as músicas; algumas canções haviam recém sido compostas e ainda não estavam bem prontas. Determinamos mais ou menos um prazo dessa pré-produção até o final do ano. Foi nesse ponto, também, que amadurecemos a idéia de onde e com quem gravar, e começou a ficar cada vez mais lógico pra nós que só faria sentido gravarmos com o pessoal da Procura-se (Quem Fez Isso?): entendíamos que no momento de gravar precisaríamos compartilhar algumas coisas (gostos, influências, intenções), precisaríamos conviver com alguém que fosse igual e diferente de nós, diferentemente da pré-produção, quando éramos só nós três (pensando, mexendo, ensaiando etc.).
Começamos as gravações no início do ano (ainda na primeira semana de janeiro) sabendo que não queríamos ter pressa, e sim qualidade, concepção, vísceras. Alguém continua, por favor?

Daniel Rech – Procuramos alguém diferente, mas nem tanto, alguém que tivesse idéias que pudessem acrescentar algo à música e não simplesmente deixar as músicas como “músicas”. A gravação foi de janeiro até outubro, com uma parada de um pouco mais de um mês no meio das gravações por causa de problemas de ordem técnica na parte tecnológica do processo. E sem a arte dos computadores, ficou impossível a continuação do disco. Porém, depois de resolvidos os problemas, terminamos a gravação, mixamos, masterizamos e lançamos Ovreca em um show memorável totalmente organizado por nós, 100% independente (como tudo e como sempre) no Terraço da Usina do Gasômetro, em Porto Alegre, junto com a banda Apanhador Só, a qual escolhemos especialmente para participar desse momento importante pela impressionante forma muito peculiar de fazer música que eles têm.

O que mudou desde as três demos anteriores?

Diego Grando – Difícil dizer. Acho que não mudou nada, o que aconteceu é que nós aprendemos a executar exatamente aquilo que queremos. E isso nos dá, me parece, mais liberdade pra criar, pra torcer, pra entortar um pouco mais as coisas.

Daniel Rech - Apesar de parecer, não há nenhuma mudança na concepção e na forma de ver as músicas. O que há na verdade é um amadurecimento e entrosamento que foi adquirido ao longo dos anos. Mas, a principal diferença é a produção do disco, que foi feita por pessoas que estiveram todo esse tempo do lado de fora, mas que têm idéias de músicas parecidas com as nossas. Isso nos livra de certos vícios que se adquirem estando tanto tempo junto e fazendo as coisas da mesma forma, um baixo, uma guitarra, uma bateria e três vozes.

Diego Altieri – Na verdade o grande diferencial são as três vozes. Considero isso o mais importante nesse novo disco. Conseguimos deixar as músicas muito mais ricas trabalhando os vocais. Inclusive, eu e o Diego estamos cantando num coral aqui em Porto Alegre. Fazemos isso com o objetivo de melhorar ainda mais os vocais. Vou aproveitar para dar uma dica a quem estiver lendo esta entrevista: participe de um coral, é muito divertido e o cara nem precisa ter uma boa voz! (palmas)



Como está sendo feita a distribuição do CD?

Diego Grando – Milimetricamente manual, própria, independente [e todo e qualquer adjetivo nesse sentido]. (risos)

Daniel Rech - Tudo é independente (por pura falta de opção) e a distribuição não poderia ser diferente. A gente fez o envelope do CD já pensando nisso: ele é fino, como um vinil, o que facilita o envio do material pelos correios.

Diego Altieri – Todos os cds passam por minhas mãos. Faço a união “cd + capa + papelzinho + lacre = Ovreca”.


De onde vêm as influências da banda? São apenas musicais?

Diego Altieri – Para tocar me influencio um pouco nas baterias do Bad Religion. Acho isso meio estranho, porque nós não tocamos hardcore, nós nunca tocamos uma música do Bad Religion e nossas músicas não parecem em nada com as do Bad Religion, mas eu curto uma levada mais rápida na batera. Uma vez, em um show, começamos a tocar uma música, e eu comecei ela tão rápido que o Diego e o Daniel não conseguiram acompanhar. Sabe como é, nos shows o cara se empolga...

Diego Grando – A mim sempre interessou muito o lance com poesia, com literatura em geral... E sempre me interessa entender como algumas pessoas que admiro lidam com isso. O Humberto (Gessinger, do Engenheiros do Hawaii), por exemplo... O Arnaldo Antunes também... aquela preocupação com a frase enquanto materialidade concreta... som, forma, sentido... bem típico da poesia visual... Acho que tem alguma coisa de desenho animado também, mas não sei muito bem o quê... nunca tinha pensado nisso.

Daniel Rech - Lógico que toda banda acha seu trabalho único, acredito que, não fosse por isso, não haveria razão nenhuma da banda existir, pois não acrescentaria nada. Porém, obviamente todos têm influências no seu trabalho, algumas diretas e flagrantes, outras nem tanto. Mas o que costumam citar bastante, a Senhor F citou, por exemplo, é que temos influências de Graforréia Xilarmônica, o que provavelmente seja verdade, já que gostamos muito da banda. Há várias outras bandas que foram citadas, como Los Hermanos, Wander Wildner, Cascavelletes, mas prefiro deixar essa parte para quem ouve de fora.

Como é o processo de composição?

Diego Grando – Muito variado, eu acho. Mas reparo que há vezes que um de nós já traz a música meio pronta, com todas as idéias na cabeça... acho que Opinião é um caso assim.

Diego Altieri - Geralmente...

Daniel Rech – É verdade. Inclusive, já tentamos fazer composições em conjunto e só Arapuca até hoje saiu dessa forma. É muito complicado entender como funciona esse processo, ele simplesmente acontece.


Os Beselhos fazem uma média de quantos shows por ano? Mais freqüentemente, onde?

Diego Altieri – Passo...

Diego Grando – Repasso.

Daniel Rech – São poucos, até porque não adianta ficar tocando toda hora em qualquer lugar, porque um mau show só queima a banda, então quando é feito um show, procuramos fazer tudo muito calculado, desde o equipamento, até o preço dos ingressos e conforto do público.

Parece que São Pedro não colabora nas datas de shows. Como é isso?

Daniel Rech – Choveu muito em quase todos nossos shows. Quando tocamos em São Paulo choveu muito, e eu e o Altieri fizemos uma visita aos amigos lá de Marília-SP, voltamos de ônibus e a chuva veio nos acompanhando de São Paulo até Porto Alegre, torrencialmente. Nem precisava de shows, era só nos encontrarmos que o tempo fechava.

Diego Grando – Confesso que essa constatação parece não se confirmar. Pelo menos é a tendência que os últimos shows apontaram. Mas nossa predisposição chuvosa já causou estragos. Uma vez, íamos participar de um projeto da Prefeitura de Porto Alegre, tocando no Parque Marinha [a céu aberto] com várias outras bandas. Devia ser num domingo à tarde. O fato é que, no sábado à noite, choveu tanto, mas tanto, que o vento arrancou todas as lonas que protegiam os equipamentos, destruindo todo o evento. O show teve de ser adiado para a outra semana, em outro local.

Todos sabemos que qualquer um que suba ao palco fica mais bonito. Há alguma curiosidade envolvendo tietes?

Diego Grando – Não que eu saiba. Na verdade, acho que nossa maior tiete é o Moreirinha. (risos)

Daniel Rech – (mais risos) O Moreirinha é um cara lá de São Marcos-RS que tem a cara do Jim Morrison e que por algum motivo é completamente fanático pela banda. Sempre que vamos tocar lá, o cara tá nos esperando no Bar, aí sempre deixamos ele subir no palco e cantar com a gente e tal, é bastante divertido.

Diego Altieri – Sou baterista. (gargalhadas) Eu fico atrás do resto da banda e as gurias nunca me notam, ou notam e eu não percebo porque sou muito moscão (risos).

Nem todos os donos de casas de shows são honestos. Já tiveram algum problema com eles?

Daniel Rech - Em um show em Caxias do Sul-RS não tinha quase ninguém no bar, os poucos que tinham foram saindo, já que o equipamento de voz do bar e a bateria eram muito ruins e o som estava inaudível. Aí o dono do Bar simplesmente desligou a chave de luz e disse: - Faltou luz na cidade inteira! Olhamos pra fora e toda a cidade estava perfeitamente iluminada. (risos) Logo depois as luzes se acenderam e havia sumido nosso afinador e uns cabos.

Quando não estão tocando, o que fazem?

Diego Altieri – No momento estou terminando o mestrado acadêmico. Também canto no coral do Instituto de Artes da UFRGS e eventualmente faço uns shows em uma banda cover (tocamos Creedence, Pink Floyd, Beatles e outras coisas do gênero).

Daniel Rech - Sou Engenheiro Civil, trabalho, ouço música e assisto muito futebol na TV, nos estádios e até treinos no Beira-Rio.

Diego Grando – Eu sou professor. Dou aula de Português e Literatura em uns cursinhos pré-vestibular. Também dou aula de Francês na UFRGS. E canto no coral junto com o Diego.

O que cada um mais tem ouvido ultimamente?

Diego Grando – Ultimamente... Arnaldo Antunes, Weezer... Gog, Moreira da Silva... Apanhador Só...

Diego Altieri – Estou ouvindo direto Weezer, Mr. Bungle, Fantômas, Pato Fu (o último disco), NOFX (depois que fui no show diminuiu um pouco a dose), Pink Floyd, Faith No More. Tenho muitos discos e procuro sempre ouvir todos. Às vezes tenho até dificuldade em escolher o que ouvir.

Daniel Rech - Ouço, além dos clássicos (Pink Floyd,. Beatles, Graforréia Xilarmônica, Engenheiros do Hawaii, Mundo Livre S/A, Júpiter Maçã, Replicantes, Pato Fu, Los Hermanos, Cascavelletes, o primeiro dos Raimundos e mais um monte de coisas), ultimamente tenho ouvido bastante Apanhador Só, Volver e Procura-se (Quem Fez Isso).

Qual a visão de vocês quanto à cena musical gaúcha?

Daniel Rech - Notei quando saí daqui que as pessoas de fora do RS pensam que aqui tudo é uma maravilha, existem muitas bandas, muito público e toda hora bandas independentes fazem shows pra muita gente em algum “lugar do caralho”.
Na verdade, Porto Alegre é uma província. Todos reclamam que não são reconhecidos no centro do país, mas xingam os Engenheiros do Hawaii por terem “se vendido”.
Aqui não há um grande festival periódico, não há um selo pra bandas novas/independentes e não há lugares bons que abrem espaço pra bandas não-grandes/médias.
Por quê? Por falta de público? Definitivamente, não! Por falta de bandas boas? Muito menos! O que acontece é que aqui há muita informação artística por todos os lados, muito espalhada, e o grande problema é juntar tudo isso, tudo deve ser garimpado, é muito confuso pra quem é do meio artístico e tudo completamente desconhecido para maioria das pessoas (que ainda acham que o sucesso significa ir tocar no Faustão). Geralmente as bandas reclamam que não há como tocar, querem vender seu material, mas não têm em casa absolutamente nenhum CD independente de outra banda que não a sua.
Resumindo, a música do Rio Grande do Sul é toda ela dominada por uma única gravadora pertencente ao grupo de mídia que detém 90% das rádios daqui, enfim...

Diego Altieri - Bah!

Diego Grando – Acho que às vezes ela é meio um elefante branco: há que se sustentar essa visão que as pessoas têm de fora a qualquer preço. E acho que isso acaba limitando um pouco, o que é uma pena... Parece que de repente passou a ser bom vestir [ser?] um rótulo... E aí a arte ganhou a importância de uma latinha refrigerante...


Por que ela se diferencia tanto da cena do resto do país?

Diego Grando – Acho que tem que perguntar isso pra quem é do resto do país (risos).

Daniel Rech – Discordo (mais risos). Talvez se diferencie pelo público, por uma certa arrogância que é peculiar à maioria das pessoas do Rio Grande do Sul quando se trata de venerar qualquer coisa que é feita aqui. Criou-se também uma cultura de irresponsabilidade musical, aquela frescura de “o verdadeiro Rock’n’Roll”, com as bandas dos anos 80. Esse mito foi alimentado por mais 20 anos.
Mas acredito que essencialmente a diferença positiva falada não existe, pelo menos não nas proporções imaginadas. Por exemplo, há festivais em Goiânia e Curitiba que aqui não há, há uma cena musical e cultural muito boa em cidades como Recife, por exemplo. Em São Paulo tudo acontece o tempo inteiro. Há pessoas que gostam de música de verdade em todos os lugares do Brasil e do mundo, a diferença é a autopropaganda ou a mídia.
Acho que a única real diferença é que, por algum motivo, aqui em Porto Alegre todo mundo ouve Weezer.

Diego Grando - Até parece que conhece todo o Brasil...



Ovreca pode ser adquirido no conforto do seu lar, basta entrar em contato com a banda pelo e-mail beselhos@terra.com.br ou pelo telefone (51) 9119-9925. O valor "simbólico" é de R$ 10,00 para quem está na capital gaúcha e de R$ 12,00, incluso frete, às demais localidades.
Uma prévia do disco pode ser conferida no http://www.tramavirtual.com.br/beselhos e no http://www.myspace.com/beselhos







Correio Sentimental







Macho de verdade, amante à moda antiga, procura mulher gostosa para relação estável. Se for loira, melhor. Mas tem de gostar de samba. E tem de ser gostosa, pô! Porque quem gosta de muxiba é gato. Tigre gosta é de carne!

Meu nome é Sandoval, mas todo mundo me chama de Falcon. Tenho 38 anos, já peguei muita cachorra, mas nunca levei a sério. Perdi minha mãe em agosto e tô sentindo que chegou a hora de encontrar uma mulher de verdade. Mas tem de ser gostosa!

Imagem Tirada Daqui

Precisa saber cozinhar, lavar, passar e gostar de arrumar a casa... essas coisas de mulher, né? Não pode ser exibida, mas tem de ser gostosa. Mulher pra casar mesmo. Carinhosa, prendada, que queira ter filhos e que gaste pouco, claro. Economia, hoje em dia, é atributo de mulher...

Olha, nem precisa ser loira. No duro. Mas tem de ser gostosa, hein? Se for bucho, não precisa nem responder.

Prefiro que não beba nem fume. Mas se for de rezar muito também atrapalha... Mas, se for muito, muito gostosa, pode ser até obreira evangélica, a gente dá um jeito.
Sou exigente, mas também sou bacana. Trabalhador, casa própria (de herança), motocicleta e até cota de clube. Em casa, não ajudo, mas pago as contas, né? Pô, partidão!
Manda aí nome, telefone e foto de cara e de corpo inteiro, gata. Se for gostosa, tamos aí.

O mais importante nessa vida é o amor, né não?
Deixa eu te amar, mulher!

* Se tiver irmã mais nova, manda foto dela também, falo? Pra garantir...

Reflexo de Deco


O QUE FIZERAM COM A GENTE?
por Deco Toledo

Vivemos num tempo em que muitas coisas deixaram de existir. A máquina de escrever, o vídeo cassete, o toca fitas e mais um sem número de coisas, invenções e objetos foram aposentados. Tudo bem até então, mas evoluir apenas naquilo que usamos, o que é matéria pura e simples, não foi o bastante. Essa onda moderninha invadiu nossa vida de forma estúpida e avassaladora, atropelando sentimentos, ignorando a emoção. Não se importando se é coração, se é amor ou televisão, o negócio é evolução, praticidade já.

Nós acatamos. Fomos precursores, parte integrante dessa castração sentimental e aceitamos, deixamos rolar numa boa. Ninguém se preocupou aonde isso ia acabar. Ninguém parou e disse: Não é assim, é muito fútil, não vai funcionar. Cegos e embalados pelo êxtase natural de toda e qualquer novidade, nos lambuzamos de liberdade afetiva, gostamos e não paramos mais... Avulsos, descartáveis, na base do fica-fica, todos ficaram... Com uma, com outras, todos ficaram, sem ninguém. Agenda cheia, coração vazio. Quantidade mil, qualidade zero. Beijos avulsos, olhares falsos, sexo convencional e um resultado ácido. Todos, muitos e ninguém, num único pacote.

A conta chegou e é cara, semi-impagável eu diria. Tem muita gente queimando a boa para pagar o analista, tem muita gente louca para sair desse parafuso sentimental. Mas não precisa ser analista para concluir algo tão óbvio... Nós nos perdemos de nós mesmos, essa é a verdade. Na integra, na real. Não adianta posar de descolada, não adianta falsear esse sorriso pra inglês ver, não cola. Não há ninguém de carne e osso que não sinta isso na pele. Não há ninguém com o mínimo de maturidade que nunca se deprimiu madrugada afora. Que nunca tenha se olhado no espelho e pensado: Porra! Que mundo é esse? Que pessoas são essas?

Estou cansado de meias vontades, meias respostas, meias palavras, meias certezas, meias pessoas. Cansado de meia razão e nenhuma emoção. Cansado dessa gente podre e dessa sociedade chula. Não quero certeza alguma, eu nasci para voar na contra mão dessa onda vazia. Eu nasci pra insistir, pra persistir, pra sentir até não caber mais.

Continuo querendo saber que sentimos o mesmo sem dizer uma só palavra. Continuo acreditando em cheiros, beijos e sabores. Continuo desejando verdades inteiras, pessoas inteiras e emoções do tamanho do mundo. Continuo tentando dizer de forma simples e sem qualquer poesia que mesmo com emails e hotmails, mesmo com todas as evoluções, revoluções (e involuções). Que mesmo sendo careta, fora de moda e marginal a modernidade, o amor é o melhor de nós.

Na paz, na melhor, fiquem bem.
Beijos,
Deco,

Carinha Marrento


Geraldino Marrento, o início de uma Saga

Nasceu numa manhã, pesando três quilos e umas gramas soltas, menino sadio, corado e careca, com chôro miúdo e carinha de pau.

Nasceu se esperneando, brigando com a vida, já tentando enxergar, meio ceguinho, braços longos, finos, mãos pesadas. Cortou-se o cordão umbilical, mas não sem briga. Deu-lhe dois chutes na mão do pai, e quase escorregou das mãos da parteira. O médico, encabulado, brincou: ‘Chamemos a segurança?’ Já foi ao peito da mãe, e brigou com seus mamilos, mesmo sem dentes, machucando e esfolando tanto que a mãe pediu água, e um lenço branco para enxugar o suor.

Não quis dormir, brigou com o berço, talvez pensasse que já sabia andar, mas não sabia, e perdia a briga. A mãe, recuperada e logo, em mera adaptação ambiental às forças descomunais da pequena criatura, o levou à sua casa, e o deitou em berço próprio. Ora, brigava com a lua à noite, ora, brigava com o sol durante o dia. Só dormia depois de brigar com o sono, mas dormia como um touro. Bufava e roncava como um touro. Não mamou, não chupou dedo, mas proclamou seu amor a um travesseiro, com o qual brigava a melhor ajustar-se a dormir. E dormia...

Nasceu marrento, e cresceu, pequenino, marrento. Menino, mostrava lingua para freiras, piu-piu às coleguinhas do colégio Católico-Apostólico-Romano, e desfilava nu pelo lado externo, entre as janelas dos quartos do segundo andar de sua casa. Uma coisa todos se perguntavam: ‘Como é que ele sobrevive?’ Enterrava seus bichinhos no quintal (trezentos e sessenta e um, ao todo) conquistados por choramingos em pedidos implorados aos pais, cansados de ver o menino enterrando bichinhos no quintal. Mas ele brigava, fazia birra, para convencer os pais e depois com os bichinhos. Em uma ocasião, numa dessas feiras de animais, levou para casa um par de pintinhos, brincou com eles como se fossem bonecos, com seus próprios bonecos, e como um tinha de morrer e bonecos não morrem... Pobre pintinho... Brigava com os professores e professoras, com os amigos, com os inimigos – todos sabemos que na infância estão nossos piores – com os pais e com os tios, até com sua avó. Depois brigou com Deus porque levou sua avó.

Deu seu primeiro beijo, mas antes brigou com o espelho, e depois do beijo brigou com a guria, ‘tadinha. Conseguiu seu primeiro emprego, mas foi demitido do emprego por brigar com os empregados, e brigou com o patrão antes de abandonar o recinto. ‘Essa possilga!’ Quando alguém tossia, desejava: ‘Morre desgraçado’. Se espirrava, dizia: ‘Tá podre!’ Formou-se, mas na formatura, brigou com quem lhe entregou o canudo, e disse ao microfone júrias indizíveis por pessoas descentes, e não que eu o seja, mas talvez algum dos leitores, e não queremos causar distúrbios desnecessários. Formou-se, é claro, advogado, mas não conseguiu passar no exame da OAB porque brigou com o inspetor da sala da prova. Passou no ano seguinte, contendo-se até o resultado, voltou à sala de provas, com outro inspetor, e o mandou tomar refresco Nabum (sentiram a descência?).

Sem deixar de brigar, em um mundo de competitividades, conquistou bom espaço, defendeu muitos brigões, mas cansou-se de brigar por outros, e decidiu se aposentar. Isso, aos vinte e oito anos de idade. Brigou com o governo, mas não lhe garantiram aposentadoria. (Continua na próxima!)

Por Geraldino, uma auto-biografia marrenta



Coluna do Jens


A noite do lobisomem
Por Jose Edi Nunes, O Jens


“...e é por isso que eu gosto lá de fora
porque sei que a falsidade não vigora”

(Felicidade, de Lupicinio Rodrigues)

Esta história quem contou foi meu avô há muito tempo atrás. Eu e minha irmã escutamos com os ouvidos atentos e os olhos esbugalhados. Agora, repasso ao leitor. Acredite se quiser.

Corriam os anos 20 do século passado quando mudou-se para uma fazendola em Viamão (cidade na região metropolitana de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul) um homem de poucas palavras, acompanhado da mulher e dois filhos. Logo após este fato, estranhos acontecimentos abalaram a tranqüilidade da pacata comunidade: nos dias seguintes às noites de lua cheia, os currais, chiqueiros e galinheiros das propriedades vizinhas amanheciam povoados de cadáveres de bezerros, porcos e galinhas estraçalhadas. Nessas noites também os cachorros apresentavam uma inquietação inusitada, latindo e rosnando até o nascer do dia. Logo surgiram relatos de que um grande lobo-guará, ou um enorme cachorro negro, andava pelas redondezas matando os animais.

Os mais velhos, conhecedores dos mistérios do mundo, suspeitavam tratar-se de outro ser – um temível e sanguinário lobisomem. Igualmente alimentavam a desconfiança de que quem encarnava a terrível criatura nas noites de lua cheia era o recém chegado de poucas palavras. Naquele tempo e entre aquela gente não era costume lançar acusações assim tão graves sem a cabal comprovação. Assim, formou-se uma comissão de notáveis da região, encarregada de descobrir a verdade dos fatos e colocar um fim ao morticínio que já abalava os alicerces da economia da pequena cidade. Decidiu-se armar uma tocaia para pegar o bicho.

Na próxima lua cheia após a reunião, cinco homens, entre os mais fortes do local, esconderam-se nas proximidades do taquaral que ficava nos fundos da casa do homem de poucas palavras. Dali viram quando ele saiu, por volta da meia-noite, e foi completamente despido ao fundo do pátio. Lá, protegido pelas taquareiras, começou a rolar-se no chão furiosamente, enquanto rosnava e resfolegava. Assombrados, os homens viram quando ele ergueu-se não mais na forma humana, mas na pele de um grande e horrendo lobo que saiu uivando em direção ao chiqueiro mais próximo. Recuperados, os homens foram atrás, munidos de facões de desbravar mato. Um deles tomou outro rumo – foi em busca dos cães, que já haviam percebido a presença da perversa figura e latiam alucinados.
Quando alcançaram o nefando transformo, o mesmo encontrava-se com os longos e afiados dentes cravados no lombo de um agonizante, apetitoso e esperneante leitão. Enfurecido pela interrupção, voltou-se contra seus agressores.

Foi uma batalha freroz. Os homens urravam e desferiam vigorosos faconaços, os cães latiam, rosnavam e atacavam, os porcos guinchavam apavorados. O lobisomem, com os dentes arreganhados, de pé como um homem, desferia golpes com as patas dianteiras. Parecia estar em todos e em nenhum lugar ao mesmo tempo.

A luta durou até quase a aurora, quando o monstro, pressentindo a chegada do sol, escafedeu-se para seu esconderijo.
Aterrorizados, os homens viram o cenário da carnificina: cães e porcos jaziam partidos aos pedaços, sabe-se se lá pelos facões ou pelas garras da criatura – também eles, os homens, ostentavam as marcas da batalha nos braços e nas pernas cortadas e manchadas de sangue.

Atordoados, foram ao boteco da vila levar as notícias aos seus iguais e beber aguardente na vã tentativa de acalmar os nervos. E foi ali, entre o relato de um e de outro, que viram passar uma carroça rumando para a capital . Sentados à frente, ao lado de um peão, iam a mulher e o filho do homem de poucas palavras. Atrás, tapado por um cobertor, ia o doente. A mulher e o guri permaneceram quietos, foi o peão quem respondeu, quando indagado sobre quem era o enfermo. O patrão sofrera um grave acidente na lida da fazenda. Tombo feio. Estava todo lanhado, precisando de cuidados médicos urgentes no hospital de Porto Alegrel. Os homens desejaram melhoras, fizeram o sinal da cruz, beberam aguardante e cuspiram no chão. Êta mundo velho sem porteira.

Essa era a história que meu avô contava a mim e a minha irmã no cair da noite em Ipanema. Quando perguntávamos se ele era um dos homens que enfrentaram o lobisomem, limitava-se a sorrir e nos propor um desafio: pagava 100 cruzeiros (uma fortuna) para aquele que fosse até a centenária figueira, no campinho perto de casa, e gritasse três vezes: lobisomem vem me pegar!
O desafio nunca foi aceito.

E você leitor, acredita em lobisomem? Eu não, ao menos de dia. Já à noite...

José Edi Nunes, o Jens

Música minha, minha Música


‘Sobre a linha de largada, vamos, eu e você...’ Assim começa a canção, uma das mais lindas, uma das mais formosas, mais sedutoras, atrantes, inocentes, contagiosas que conheço, de uma banda que um dia se chamou Os Amigos de Natasha (Haverim shel Natasha), mas que já não existe mais, em Israel. ‘Al kav hazinuk, boi, ani veat...’


Fala sobre uma corrida, uma competição, sem dúvida alguma, porque israelenses sempre competem. A harmonia existe na competição, na corrida, no suor que goteja de suas testas, das lágrimas que escorrem dos seus olhos, das bolhas e dos calos a pestanejar seus pés, juntos, um ao lado do outro, empatados.
Correm, com as palmas das mãos, com as pontas dos dedos, com as palmas dos pés e com as unhas do mindinho, com os joelhos, tornozelos, com as partes interna e externa da coxa, e correm como se suas vidas dependessem da corrida. Não economizam um grama sequer de vontade, de paixão, de suas próprias essências, e não gozam desperdício na saliva de suas bocas, que saliva, que saliva, que saliva...

Nessa corrida há um vencedor, e há um perdedor, seja ele o par ou a companheira, seja ele quem for, o empate existe apenas no percurso. O percurso os faz flutuar, como pássaros, razantes de rapinas calcadas em ondas aéreas, sentidas pelo vento a cortar seus rostos, levando a poeira que do solo se ergue à sua passagem. E no ar, a lembrança do companheirismo, do carinho, de outras competições harmoniosas, de outras tardes e outras noites, outras madrugadas, outras manhãs encontradas na mente de quem as viveu, em outros momentos. Os corpos se acabam. A corrida os desgasta, mas para que haja um vencedor, há de haver um perdedor, e o perdedor é quem primeiro desiste, e nenhum quer desistir.

Mas, no refrão dessa canção dos Amigos de Natasha, diz o homem:

‘E eu me confundo, e caio...’ E segue o canto em seus murmúrios fatais. ‘Vaani mitbalbel venofel...’

Ela vence. Como não venceria? Quem consegue não acabar antes da linha de chegada, acompanhado do anjo que o persegue, que o acolhe, que o encolhe e guarda no bolso do peito? Quem resiste, quando as lágrimas umidecem os passos, e a saliva umidece o bom ar, e o suor apenas ofusca um mais forte olhar, um mais forte perceber... Ora, se não é trapaça, se não é cachaça, se não é fissura... Não importa:

'E eu me confundo, e caio...’

Essa é uma música minha, minha música!

RF

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