Wednesday, August 08, 2007

CLAQUE-TE! E o cinema nacional aos olhos de Roberto Queiróz


Por que tantos homens doentes, depressivos e tresloucados no cinema nacional?
Por Roberto Queiroz


Noite de quarta-feira chuvosa. O pobre cinéfilo suburbano autor dessa coluna decide – na falta de outra programação mais instigante – ir ao cinema privilegiar o cinema nacional (que, atualmente, em sua modesta opinião, vive um período de altos e baixos). Pouco mais de uma hora e meia de projeção são suficientes para que ele fique alucinado diante daquele obcecado adorador de bundas, Lourenço (interpretação irretocável do ator Selton Mello) em O Cheiro do Ralo, filme do diretor Heitor Dhalia. O cérebro desse fanático por sétima arte, após ter se assoberbado pela visão de mundo mercadológica do protagonista (que vê a humanidade como um grande objeto à venda 24 horas por dia), pára e reflete: por que a nossa produção cinematográfica anda tão cheia de homens depressivos e tresloucados? De onde vem tanta inspiração para loucura desmedida?

É de, no mínimo, intrigar. Tantos homens, uma só doença (na maioria dos casos, reflexo de uma solidão pungente, aguda). É o caso de Rímini (Gael García Bernal) em O Passado, de Hector Babenco, atormentado pela esposa que não se conforma com o divórcio após tanto tempo de casamento e o deixa numa situação de aprisionamento quando se tratar de envolver-se em novas aventuras amorosas. Ou quem sabe você prefira o lado fossa de Pedro (Rodrigo Santoro) e Ênio (Leonardo Medeiros) em Não Por Acaso, de Phillipe Barcinski, viúvos de forma catastrófica que precisam reaprender a amar (o primeiro, uma nova relação; o segundo, a filha adolescente, com quem não mantém a menor afinidade). No caso de Ciro (Júlio Andrade) em Cão sem Dono, de Beto Brant e Renato Sciasca, a falta de perspectiva na vida e a crise existencial que o adoece parece só ser compreendida pelo melhor amigo do homem (parceiro fiel e silencioso: talvez sua melhor vantagem).

Casos clássicos nesse gênero são aqueles em que protagonista está em busca da mulher ideal, passando por muitas provações para encontrar a alma gêmea. Essa parece ser exatamente a situação de Martín (Felipe Camargo) em Jogo Subterrâneo, de Roberto Gervitz, que cria em sua cabeça um enlouquecido desafio: encontrar a mulher da sua vida em um vagão de metrô, Antônio (marco Ricca) em Crime Delicado, também de Beto Brant – mestre na composição de homens derrotistas e perdidos moralmente – na pele de um crítico teatral movido excessivamente pela razão que após se envolver com uma mulher de atitudes extremamente desinibidas que mantém um relacionamento com um pintor bem mais velho do que ela faz sua vida dar um giro de 360º num rumo extremamente perigoso e sem certezas aparentes e Benjamim Zambraia (vivido por Paulo José), modelo publicitário veterano de Benjamim, de Monique Gardenberg, que acredita ter encontrado a reencarnação do grande amor de sua vida, passando com isso a cultivar as delícias e os horrores de uma paixão perdida.

Outras construções dramáticas obsessivas que agradam muito a esse sádico colunista são o repórter Célio Rocha (Pedro Cardoso) de Redentor, de Cláudio Torres, tentando convencer o amigo de infância e construtor corrupto Otávio Sabóia (Miguel Fallabella) a doar todos os seus bens às classes menos abastadas. Hilário! Seu Heitor (Fernando Teixeira, sublime) no papel do avô hipócrita que explora sexualmente a neta no nordeste marcado pela opressão e pela podridão social humana de Baixio das Bestas, do sempre polêmico Cláudio Assis e, finalmente, mas não menos exuberante, o astrofísico Antônio (José Wilker) de O Maior Amor do Mundo, de Cacá Diegues, que após descobrir ser portador de um tumor cerebral inoperável realiza uma jornada pessoal em busca da verdadeira identidade de sua mãe (que acreditava conhecer desde seu nascimento), tendo como pano de fundo um Rio de Janeiro caótico e desmotivante para qualquer pessoa que queira dar a volta por cima.

Quanta gente doente, não é mesmo? A doutora Nise da Silveira se viva, adoraria ter toda essa clientela a sua disposição. E isso só pra começar! Por que se esse pobre fã de películas fosse cadastrar o número de personagens masculinos psicóticos e alucinados existentes na história do cinema brasileiro, terei material de pesquisa para uma vasta enciclopédia (quem sabe um almanaque, que a palavra está na moda). Taí... Pode ser uma grande idéia. Ainda bem que toda essa loucura se realiza apenas na ficção. Imagine esse bando de loucos e derrotados aí, na sua cidade, cantando as suas namoradas, invadindo seus metrôs e trens, explorando suas filhas... Chega de depressão! Quer mais, vai ver no cinema. Lá é que é lugar de doido. Até eu fui.

Para ler a coluna O Povo e o Livro, clique aqui.

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