O Povo e o Livro
A EX-ESTRANHA POESIA DE PAULO LEMINSKY
Por Halem Souza
as mãos que escrevem isto
um dia iam ser de sacerdote
transformando o pão e o vinho forte
na carne e sangue de Cristo
hoje transformam palavras
num misto entre o óbvio e o nunca visto”
Do poema Sacro Lavoro
Paulo Leminski (1944-1989) talvez tenha sido o mais importante poeta a mostrar, ainda que não de forma “militante”, como alguns concretistas, neo-concretistas e certos tributários de João Cabral de Melo Neto eram (e são) tão chatos. Numa época (1970-1980) em que poesia era sinônimo de hermetismo, de jogos verbais que faziam a cabeça apenas de professores universitários – e, portanto, excluíam os leitores pobres mortais – o artista polaco-curitibano trouxe de volta a alegria de ler um poema, com sua simplicidade invulgar.
Estive relendo o livro O ex-estranho (São Paulo: Iluminuras, 1996), organizado por Alice Ruiz e Áurea Leminski. Segundo Ruiz, os textos chegaram a ela num envelope, como “cópias ou versões de poemas já publicados, outros visivelmente inacabados e outros prontos”. Será preciso dizer que essa já deixou de ser uma poesia “estranha”, até mesmo para a academia e a crítica – não obstante ainda procurem onde encaixá-la?
Encontramos poemas nos quais o que importa é somente o verso lúdico, sonoro:
Qualquer coincidência
é mera semelhança
enquanto quixote pensa
sancho coça a sancha pança
Do poema Feliz coincidência
Em outros, por outro lado, como nos “debates filosóficos” dos pares antitéticos magro e gordo, azar e sorte, destino e acaso, para citar alguns, carregados de musicalidade e escolhas certeiras de palavras, o que vale é a carga semântica. Como neste, que encerra o livro
é simples, complicado, seja simplesmente
simples: não seja complicado
acha complicado ser simples?
simplesmente seja complicado
simplesmente? não é simples!
quem pensa assim simplesmente
não pensa assim por ser simples
pensa por não pensar simplesmente
Halem Souza (Quelemén)
Belo Horizonte, Minas Gerais, Brazil
Sou "um hóspede do tempo"(Zélia Duncan).Mas enquanto não passo, vou contando e lendo histórias na biblioteca em que trabalho.
Por Halem Souza
as mãos que escrevem isto
um dia iam ser de sacerdote
transformando o pão e o vinho forte
na carne e sangue de Cristo
hoje transformam palavras
num misto entre o óbvio e o nunca visto”
Do poema Sacro Lavoro
Paulo Leminski (1944-1989) talvez tenha sido o mais importante poeta a mostrar, ainda que não de forma “militante”, como alguns concretistas, neo-concretistas e certos tributários de João Cabral de Melo Neto eram (e são) tão chatos. Numa época (1970-1980) em que poesia era sinônimo de hermetismo, de jogos verbais que faziam a cabeça apenas de professores universitários – e, portanto, excluíam os leitores pobres mortais – o artista polaco-curitibano trouxe de volta a alegria de ler um poema, com sua simplicidade invulgar.
Estive relendo o livro O ex-estranho (São Paulo: Iluminuras, 1996), organizado por Alice Ruiz e Áurea Leminski. Segundo Ruiz, os textos chegaram a ela num envelope, como “cópias ou versões de poemas já publicados, outros visivelmente inacabados e outros prontos”. Será preciso dizer que essa já deixou de ser uma poesia “estranha”, até mesmo para a academia e a crítica – não obstante ainda procurem onde encaixá-la?
Encontramos poemas nos quais o que importa é somente o verso lúdico, sonoro:
Qualquer coincidência
é mera semelhança
enquanto quixote pensa
sancho coça a sancha pança
Do poema Feliz coincidência
Em outros, por outro lado, como nos “debates filosóficos” dos pares antitéticos magro e gordo, azar e sorte, destino e acaso, para citar alguns, carregados de musicalidade e escolhas certeiras de palavras, o que vale é a carga semântica. Como neste, que encerra o livro
é simples, complicado, seja simplesmente
simples: não seja complicado
acha complicado ser simples?
simplesmente seja complicado
simplesmente? não é simples!
quem pensa assim simplesmente
não pensa assim por ser simples
pensa por não pensar simplesmente
Halem Souza (Quelemén)
Belo Horizonte, Minas Gerais, Brazil
Sou "um hóspede do tempo"(Zélia Duncan).Mas enquanto não passo, vou contando e lendo histórias na biblioteca em que trabalho.
1 comment:
Halem:
Que bom encontrá-lo aqui também. Tenho muito a aprender com o mestre.
Este poema dos pares antitéticos é tudo de bom.
Abraço e sucesso aqui no Reação!
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