Chico e Brito Comentam
Tirei daqui, ó aqui
A Política
Tarde vermelha na Praça da Árvore, e enquanto a meninada caminha acompanhada de colegas ou das babás, ou até mesmo das mães apressadas, de mãos dadas ou saltitando, os dois senhores, já sentados em seu ponto ritualístico de encontro, filosofam sobre a vida.
“Eita meninada bonita...”
“Eita, Chico, inspirado ou pirado?”
“Um pouco dos dois... Vem cá, diz uma coisa pra eu.”
“Pra mim...”
“Não, não... Pra eu mesmo, diz, velho Brito. Te lembras quem disse aquela frase clássica: ‘Você pode enganar algumas pessoas algumas vezes, mas não pode enganar todas as pessoas todas as vezes’?”
“Apelão...”
“Apelão por quê??”
“Memória, meu velho? Memória? Bom... Deixa ver... Lembro sim. Bob Marley.”
“Que Bob Marley, gagá, que isso!”
“Bob Marley sim senhor, ‘yú kén fú sãm pipú sãmitaimis’ e pá.”
“Nada a ver, Brito, faz favor. Se não me engano foi Abraham Lincon.”
“Pode até ser, mas eu tenho certeza que foi o Bob. O que te come, amigo?”
“Ninguém me come, velho, tá de brincadeira?”
“Falo sério, o que te come? Ou seja, pseudo jovem, Alzheimer enrustido, o que lhe incomoda?”
“Ah... Tava aqui pensando... Pensando nessas crianças, pensando na vida, em como as coisas vão e voltam, e no fim elas acabam nunca indo de vez, sabe?”
“Não sei...”
“Explico, vê só:
Essas crianças voltando da escola, algumas com celular na mão, outras com álbum de figurinha, umas jogando futebol, outras correndo pra casa pra assistir televisão, jogar video gueime... Quase nenhuma delas lê... Nem gibi, meu velho, nem gibi! E as mães apressadas. Que pressa, pra quê pressa? Pra meter a criança em frente à TV e se ocupar com coisas ‘mais importantes’. E tem coisa mais importante que educar criança?”
“Prefiro permanecer calado, tô com preguiça de responder.”
“Não responde, melhor, melhor. Mas veja só você, que encontrei neste pensar a resposta ao que tanto nos incomoda, à pergunta que não cala, tagarela, à charada que soluciona o conflito entre a política e o povo. Encontrei pensando...
Primeiro, pensei em Sócrates.e na fundação da palavra ‘política’. Política, meu ignóbil sabido, signifcava e supostamente significa povo.
Agora, Sócrates – daqueles mesmos tempos gregos em que nascia a política e seus representantes – em suas teorias, jamais questionou a base: Os direitos humanos. A necessidade básica de se pensar e aprender que tudo é feito da mesma essência. Claro, acreditava em deuses e em superioridades, mas em sua filosofia, amigo, ninguém era melhor ou pior, na prática, do que ninguém. Todos eram feitos, dizia, da mesma exata coisa imperfeita, e esta coisa era inferior à criação em si... Tá certo, abstratismo pra burro, mas não se duvidava, a partir deste pensamento, que o camarada negro ou o camarada índio, ou o asiático ou o homossexual ou o deficiente fossem piores do que os demais, todos humanos. Metiam pau em surdos, tá certo, ou cegos, sei lá eu, mas era coisa leve, nada pra se chamar a polícia...
Daí que Sócrates levou a pior, velhíssimo amigo... Levou a pior, porque ao ensinar sua filosofia, decidiram os políticos, corrompia a mente da juventude. Levou a pior e foi executado, mesmo depois daquele discurso apologético todo em que ele dizia saber mais do que todos por admitir que nada sabia.
Depois disso, do básico já ensinado e passado adiante, começou o nascimento das escolas que decidiam questões aparentemente mais importantes. Platão, a respeito das Formas, explicando em metáfora que todos vivemos em uma caverna escura, acorrentados, e apenas podemos ver sombras, cópias imperfeitas das Formas essenciais. Aristóteles, a respeito da união entre a Matéria e a Forma, das quatro regras elementares para se saber o que a Forma é (do que é feita, quem a fez, qual sua matéria e para que serve), níveis do espírito (vegetal, animal e intelectual) e outros diversos assuntos... São Agostinho, adaptando Platão, e São Tomás adaptando Aristóteles para, voila, explicar e difundir o pensamento cristão da época. Alguns outros tentaram, pensaram e arriscaram, mas em período de conquistas, guerras, reforma cultural greco-romana, invasões bárbaras e inquisições cristãs, a filosofia entrou em coma e, por um mlênio, se apagou. A longa Era da Escuridão tomou conta do planeta... Não havia livros... Muito poucos, pouca cultura, pouca arte, poucos novos pensamentos, muita assimilação e confusão tomando conta da geral.
Foi, meu barato, que quando fundaram a política já mataram quem ao político não se prostrasse... Foi, que quando conseguiram pensar pela primeira vez sobre as igualdades sociais, conseguiram também aniquilar a possibilidade de um verdadeiro livre pensar em torno delas. E logo, sem mais chance, se esqueceram delas durante séculos... Foi também, que o atraso milenar destas eras escuras prova que algo está errado com a teoria de Abe Lincon, ou melhor, Bob Marley, se cai em teu agrado...”
“Eta, e o que há de errado, Aristonto?”
“É possível enganar o povo.. É possível aniquilar as chances verdadeiras de se atingir a democracia que a política foi criada a gerar e viabilizar...”
“Tô vendo...”
“Ídolos estúpidos apoiados por políticos estúpidos, ou vice-versa... Estes ídolos vestem acessórios caros, e o público também, repentinamente, precisa deles... O vizinho comprou o último video-gueime, seu neto também quer... Papai tem celular e não sabe dizer não? Filhinho de de dez anos também tem... A música é a melhor pra garotada, porque os piores assim disseram, porque os piores assim tem grana pra bancar o marquetingue, e repetem um milhão de vezes a mesma merda para que o ouvido de suas crianças vire penico. O seu já virou, velho amigo, mas mesmo o de uma pessoa normal, também já está acostumado, porque esse capitalismo tem mais ou menos a sua idade, velho Brito.”
“Tem...”
“Pois é... A Jájá, filha da Xuxa, Rouge e Broz, Big Bunda Brasil, Ronaldinho Fofômeno, Picarelli, Momo Soares, Charlie Dáun... E Joãozito Ubaldo Ribeiro? Não é que a reporter em Miami perguntou: ‘E o senhor, quem é?’ Já pensou se em Portugal o pessoal faz isso com Saramago? Mandam ele re-colonizar o Brasil! A história dita, a politica morta, a igualdade social sempre esquecida, meu amigo, e se estamos cá às prévias dos tempos de uma nova escuridão, quero mais é morrer logo!”
“Amén, velho safado!”
...
“Peralá, morre não, morre não... Vaso ruim apodrece aos poucos. Vê lá a meninada, seu Chico... Vê lá se eles não querem mais do que isso...”
Roy Frenkiel
6 comments:
Um beijo pro Chico, um beijo pro Brito e outro procê. No mais, a certeza de que os guris querem mais... muito mais.
Enquanto há vida, há possibilidades milhardárias, ainda que sem um único puto pila no bolso, pois é no cérebro e no coração que está o esquema todo, e não nas calças, ou no banco - vide quanta gente se divertindo com esse negócio gratuito que é a internet. Aviso ao ChicoBrito que a frase, um pouco diferente, é do Abe Lincoln. E que a gurizada anda lendo menos gibis, mas mais emeios, msns e quetais...
Velho Chico sabe das coisas! Adorei o texto...Um trechinho dos Titãs pro cê..Bj!
...............
Bebida é agua
Comida é pasto
Você tem sede de que?
Você tem fome de que?
A gente não quer só comida,
A gente quer comida, diversão e arte
A gente não quer só comida,
A gente quer saída para qualquer parte...
Chico e Brito Rulez!!!!!11
And, by the way, I forgive you! :P
Gostava demais de conversar com esse Aristonto, sujeito interessante...
bjs
Ophélia
Salve, Roy: acredito que nós que gostamos de ler, livros, somos uma espécie em extinção. Até recentemente estive em Floripa e constatei, consternado, que a gurizada não lê mais gibi – fundamental para despertar o gosto pela leitura nos petizes. Gostam muito de vídeo-game e do Cartoon Network, e também de brincadeiras de rua (quando estava lá, a temporada era de bolinha de gude. A propósito: gostaria de saber quem elabora o calendário de brincadeiras da gurizada: pandorgas, pião, futebol...têm seus períodos determinados durante o ano. Por quem? Como eles sabem quando termina a época do futebol e começa a do pião? Mistério, mistério...). Voltando ao começo: a falta de leitura me preocupa muito – não conheço outra forma eficaz de adquirir conhecimento sobre conquistas humanas e valores éticos e morais. As escolas também não ajudam muito, já que a moda agora é passar o aluno de ano de qualquer jeito – para evitar hipotéticos traumas futuros, a política educacional investe na formação de semi-analfabetos.
Quando a enganar as pessoas: nesse quesito não podemos esquecer a força de persuassão da mídia. Por vezes conseguem enganar a quase todos. Por isso, devemos estar sempre vigilantes, mandando bala pra baixo contra as falanges do mal. Um abraço. (Viste, teremos segundo turno. Cara, não sei se agüento. Tô cansado, querendo desanimar).
Um abraço.
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