Wednesday, February 14, 2007

O Povo e o Livro









Literatura é o quê, mesmo? ou a morte de Sidney Sheldon
Por Halem “Quelemém” de Souza

No final do mês de janeiro deste ano, morreu o escritor norte-americano Sidney Sheldon. Nascido Sidney Shechtel, o autor de “O outro lado da meia-noite” foi, possivelmente, o escritor mais lido no mundo, em todos os tempos. Vendeu mais de 300 milhões de exemplares, traduzidos para 51 idiomas e editados em mais de 180 países. Começou a escrever romances aos 50 anos, produzindo 18 livros no total, mas Sheldon também trabalhou para o Cinema e TV (foi o criador da série “Jeannie é um gênio”).

Não vou aqui detratar Sheldon, como costumam fazer os “entendidos” em Literatura. Nem vou enaltecê-lo, dando uma de “descolado” gente boa. Sua obra me é indiferente. Aliás, para ser franco, só li um de seus livros, justamente o primeiro que publicou, “A outra face”. Quero apenas constatar um fato e tentar ver a arte literária a partir do que Sidney Sheldon representa.

(Imagem retirada de: wiredforbooks.org/images/Sidney-Sheldonpage.jpg )

O fato a ser constatado está nos números hiperbólicos apresentados acima. Não há como negar: Sheldon é um escritor eficiente. Conseguiu desenvolver e encontrar, em sua escrita, uma bem sucedida técnica para atrair o leitor. É o próprio escritor quem diz:
“Escrevo meus romances de modo que, quando o leitor termina um capítulo, tem que ler o outro. É a técnica das séries de televisão, de deixar o leitor pendurado no abismo".
(A entrevista completa pode ser lida em http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u56189.shtml)

E não é desagradável lê-lo. Como passatempo é bastante apreciável, até. No caso de “A outra face”, por exemplo, o que se acha em suas páginas é um romance policial, com doses generosas de suspense, e um personagem (o protagonista do livro, o psicanalista Judd Stevens) envolvido numa trama da qual, nós leitores, não conseguimos vislumbrar saída. Quem o persegue? Algum de seus pacientes? O policial mal-encarado McGreavy?Como disse, é um bom passatempo ler um escritor desse tipo. Mas isso é Literatura?

Certamente que não. E é nisso que erram os estudiosos ao se deterem sobre autores como Sheldon, Paulo Coelho, Agatha Christie (cujos livros devorei na adolescência). Autores deste viés estão fora da arte da escrita. As categorias analíticas da crítica literária não se aplicam a eles. Produzem um outro tipo de texto que pode, de vez em quando, assemelhar-se à arte.

Não há, em Sheldon, o elemento fabular das grandes narrativas; não há o desejo de reinvenção do idioma, desejo oculto ou manifesto, por vezes, dos bons escritores; não se encontra em seus romances a profundidade filosófica das obras mais marcantes. Nas palavras de Sheldon, “os romances que escrevi não existem para justificar nada – eles foram feitos para entreter o leitor”.

É evidente que a Literatura também pode entreter, mas essa não é sua missão mais humanizadora, nem é só o que procuram os leitores mais exigentes. A opinião emitida aqui pode ser interpretada como uma visão elitista da arte literária e esclarecê-la, infelizmente, não será possível nesse artiguete. Contudo, reitero: Sheldon possuía certos méritos, só que nenhum deles tinha a ver com a Literatura.
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EXTRA - ESPECIAL DE CARNAVAL!


O Carnaval de Manuel Bandeira

Acredito que, quando se indicaram os temas desta edição do Reação Cultural – e, entre eles, estava O CARNAVAL – pensava-se na festividade, no fenômeno em si, propriamente, em seus aspectos antropológicos e sociais.

Mas, no momento que li a pauta, nem sequer pensei no evento. A primeira coisa que me veio à cabeça foi o livro “Carnaval” de Manuel Bandeira e em um poema contido nele, “Sonho de uma terça-feira gorda”.

Surgido em 1919 – o segundo da carreira do autor – “Carnaval” é um livro significativo porque indica uma mudança tremenda na poesia de Bandeira, mudança que ficaria mais clara no livro posterior, “Ritmo dissoluto” e se consolidaria definitivamente em “Libertinagem”, já em 1930.

Em “A cinza das horas”, primeira reunião de poemas do escritor pernambucano, qualquer leitor se dá conta do enorme débito de Manuel Bandeira com as gerações de poetas anteriores. Mesmo em seu segundo livro a quase totalidade dos textos tem uma ligação direta com os modelos estéticos anteriores (a feição simbolista de uma boa parte desses poemas foi mesmo admitida por Bandeira). Mas em “Carnaval” o sinal de incorporação de um novo ideário artístico estava impresso nos poemas “Os sapos” (que foi lido pelo poeta Ronald de Carvalho na Semana de Arte Moderna de 1922, causando imediata reação do público) e “Sonho de uma terça-feira gorda”.

“Sonho de uma terça-feira gorda” estabelece duas oposições. A primeira, entre a contenção de um par de namorados - “Nós caminhávamos de mãos dadas, com solenidade,” - e a agitação típica do carnaval - “Era terça-feira gorda. A multidão inumerável/ Burburinhava. Entre clangores de fanfarra”. A segunda se dá entre o aspecto exterior da fantasia, que inclusive contraria o colorido álacre usual deste tipo de vestimenta, e o sentimento experimentado pelo casal:

“Eu estava contigo. Os nossos dominós eram negros, e negras eram as nossas máscaras/ Íamos, por entre a turba, com solenidade,/ Bem conscientes do nosso ar lúgubre/ Tão contrastado pelo sentimento de felicidade/ Que nos penetrava. Um lento, suave júbilo”

Mais do que uma apreciável construção poética, “Sonho de uma terça-feira gorda” foi o primeiro poema em verso livre de Manuel Bandeira que veio a público, anunciando o futuro modernista que se tornaria um clássico da nossa poesia,

4 comments:

Anonymous said...

Concordo que a literatura de Sidney Sheldon, apesar do articulista não considerar dessa forma a sua produção escrita, é de entretenimento. O camarada lê e esquece. Vale enquanto dura. Mas e o que dizer de outros autores - estes respeitados pela crítica - como Dashiell Hammet e Raymond Chandler, cuja escrita também era destinada a entreter. Seriam estes literatos e Sheldon não? Por quê? E o que dizer de Paulo Coelho? Não sou fã do cara (na verdade só li um livro seu), mas não dá pra desconhecer que é o escritor brasileiro que mais vende livros em todos os tempos, e é tratado aos pontapés em seu próprio país e recebido com os louros da glória fora dele. Será o complexo de vira-latas do brasileiro, de que falava Nélson?
A propósito, não sou fã de Sheldon nem do Paulo Coelho. É só o gostinho de polemizar minimamente.
Um abraço.

Caiê said...

Olá Halem.
Para mim, toda a literatura válida é aquela que nos faz acordar para uma realidade que sempre esteve diante dos nossos olhos ou dentro de nós mas que nunca notámos antes... É aquela que nos dá um estalo na cara (os brasileiros dizem um tapa, eh eh eh!) para a gente viver mais despertos, para a gente ficar mais vivos daí em diante. :) :)

Li o que me disseste sobre Descartes. Tens razão - mas eu é que nunca concordei com esse senhor. Como posso concordar com alguém que disse que um animal é igual a uma máquina? ;)
Abraço.

Escafandrista said...

Concordo inteiramente com você, Halem. Certas obras não devem ser consideradas literatura, nem se deve aplicar a elas o arsenal analítico da crítica literária. O resultado é conhecido de antemão e acrescenta muito pouco ao leitor (da obra e da crítica).
Abraços.

Jean Scharlau said...

O adolescente criança que sobrevive em mim à base de Toddy presta sua homenagem a Sheldon por conta de Jeannie é um gênio. No mais fico com Bandeira.

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