Friday, January 12, 2007

Arquitetura Social

O cliente desconhecido

A máxima que apregoa “O cliente sempre tem razão”, torna-se discutível na arquitetura por conta dos profissionais que ainda se esquecem que projeto não é um produto a ser fotografado , catalogado e exibido ...apenas , mas executado e habitado por pessoas e suas necessidades .

Há três décadas nós arquitetos assistimos , entre assustados e deslumbrados , cerca de 1/3 das grandes cidades ser edificado através das incorporações residenciais imobiliárias , responsáveis, primeiramente, pela verticalização das construções e agora ,também, pela “horizontalização “ dos empreendimentos , através dos condomínios residenciais fechados . O mais engraçado , se não fosse trágico , é que o “cliente” que agora exige e quer ter razão - além de muito lucro - , não é mais aquela figura inspiradora do dito popular , mas a insofismável , globalizada e apoteótica figura do empreendedor.

A grande disponibilidade de capitais e queda nas taxas de juros que ocorreu no Brasil nos anos 80 propiciaram grandes investimentos no setor da construção . Na virada da década , assistiu-se à maior crise de liquidez do mercado por excesso de oferta ( eu assistí, a grande imprensa registrou ) . Os bancos comerciais foram sucessivamente se afastando do setor , os capitais procuraram novas modalidades imobiliárias , surgiram novas formas de financiamento .

A maioria dos arquitetos sofre ao tratar o projeto como ele é verdadeiramente : um produto a ser comercializado. Herdamos ranços do profissional-artista, profissional semi-deus diferenciado , criativo, perfomático , incomparável tradutor de sonhos , intérprete das necessidades humanas , idealizador de abrigos , que tem pela sua cria(ção) o sentimento egoísta de posse, cujo valor sentimental torna ,não raro , penoso o processo comercial.

A boa arquitetura, união da técnica e da arte , personalizada para cada cliente e sua família- cujos hábitos são estudados a exaustão e por detalhes - cede lugar a arquitetura de mercado. A orientação dada ao profissional ,pelo empreendedor, é fruto de conceitos de administração de marketing, orientada para a satisfação , necessidades e desejos de um cliente desconhecido, de um futuro consumidor sem cara e sem personalidade, criado a partir de pesquisas formatadas por agentes imobiliários condicionados pelo quesito lucro , somado às referências teóricas e ou experiências anteriores , sem um programa de necessidades mínimamente abrangente , além de limitado muitas vêzes pelo preço da terra.

A falha , ao desenhar um empreendimento, é a de não saber o que o consumidor final quer, ou precisa, ou sonha . Apenas isso. A miopia está na indevida preocupação com o produto e não com a necessidade – como dar mais valor a telefonia e não a comunicação, ao veículo e não transporte, a aparelhos de ar condicionado e não ao conforto doméstico.

De um lado estão os empresários oferecendo seus produtos com agregados de fácil persuasão : segurança, valorização do imóvel , lazer, integração - e do outro os consumidores , buscando a satisfação de seus desejos, das suas necessidades, a concretização dos seus sonhos. Entre eles a figura nada deliberativa e quase patética do arquiteto – recebendo ordens do primeiro , sem contato com o segundo.

É complexo o caso da moradia: ela é proteção, suporte, referência, endereço, crédito; segurança física, moral, social e econômica; conforto, beleza, integração, descanso, lazer; intimidade, afetividade, aceitação, reflexão ;auto-estima, auto-imagem, valores, “status” e poder, entre outras. Dependendo do segmento a que se destina, ou o já banalizado público-alvo, a composição e importância de cada uma destas necessidades será muito diferente.

Cristina Bondezan nasceu e cresceu em São Paulo entre apaixonados e passionais italianos dos bairros do Cambucí e da Mooca. É arquiteta e urbanista, empresária, docente no curso de Design de Interiores. Exerceu vários cargos públicos na área de Planejamento Urbano , fato do qual não se arrepende , muito se orgulha , paradoxalmente não gostaria de repetir a experiência . Seu escritório profissional situa-se na cidade de Marília, interior de SP . Um sonho : realizar os sonhos . Um prazer : Viver ...intensamente e com olhos atentos. Uma paixão: Portugal.

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